O Peso Que Carrega — Scarlett Braz do Nascimento

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Ícaro Demetrius. A testemunha da série Violências miméticas, 2020.
Ícaro Demetrius. (Im)positividade da série Violências miméticas, 2020.

Icaro Demetrius trás ao mundo a série Violências Miméticas com duas obras intituladas A Testemunha e (Im) Positividade, produzidas em 2020 com técnicas mistas de pintura e desenho utilizando materiais como lápis de cera, tinta guache, tinta acrílica, tinta para tatuagem, caneta esferográfica e hidrocores. O artista denomina a série como um compilado de memórias transformadas em imagens. Essas obras carregam vivências do artista e exprimem sentimentos de repreensão e censura.

A testemunha apresenta objetos cotidianos como livros, incenso, vaso de cacto, flor e também animais. As cores predominantes são o vermelho, azul, verde, marrom e bege. Na segunda obra de titulo (im)positividade encontra-se um homem negro com correntes, um chapéu de forma monstruosa em sua cabeça escrito positividade. De forma antagônica a palavra que intitula a obra, de seu rosto escorre há sangue e lágrimas.

As imagens aparecem centralizadas no papel, com cores fortes e contrastantes. A ilusão de tridimensionalidade e profundidade é empregada pelo artista retratando a realidade, mesmo que a imagem transmita cenas irreais como um cacto com olhos, chapéu com formas de um monstro extraterrestre. O irreal aqui, pode ser entendido como o funcionamento real do pensamento, da imaginação.

Em conversa, o artista revela que a primeira obra remete a sua expulsão de casa, momento conturbado que envolveu um acidente traumático onde sua cabeça foi batida na quina da mesa. O evento, impregnado de uma memória dolorosa, explica a grande mancha de sangue presente no canto da mesa da imagem.

Na segunda obra, o artista representa o momento em que seu pai, que é militar, descobriu que ele era gay. Portanto, a imagem é uma representação de seu pai, que de forma impositiva, tenta ditar as regras e exercer o controle. A figura sorri, mesmo em meio a lágrimas e sangue.

As duas obras são bem dramáticas e conseguem passar essa sensação. Porém, em A Testemunha tenho a sensação de ser mais leve do que acontece fora da pintura. Essa leveza possivelmente é alcançada a partir da presença do incenso e da flor na composição da imagem. Ou através da rigidez do cacto, permeado por teias de aranha que esperam sua presa. possivelmente a pequena abelha que sobrevoa a flor azul em um processo de polinização. Nessa proliferação da vida e na cadeia predatória que percebemos entre a aranha, a abelha, o cacto há uma vida que resiste. A flor, ainda azul e com vivacidade, sobrevive com pouca água, absorvendo as poucas gotas que lhe restam dentro de um copo quebrado. Sobrevivência e resiliência diante da tortura, da prisão e de seus pesadelos, tentando ser positivo mesmo que esteja quebrado, derramando lágrimas.

Acredito que as duas obras abordam a relação do seu pai. Para mim, é evidente o chapéu militar alienado seja ele e também a aranha que constrói a sua casa em um lugar espinhoso e rígido. Porém,há uma pessoa que tenta manter a calma com o incenso e com as flores, que trazem a sensação de leveza e positividade mas que acabam sendo afetadas com gotas do sangue jorrado.

Com suas obras Ícaro conseguiu passar todo o seu sentimento; o peso que carrega me faz pensar no tanto de pessoas que sofrem a mesma situação que está presa numa conduta que não é sua e só por você ser quem realmente é sofre um julgamento imenso e você tem que seguir sorrindo de todas as maneiras se não pode acontecer algo muito mais terrível. Violências miméticas passadas de geração a geração, violências pequenas que não são tão pequenas assim carregam traumas, pesadelos e dor. Mas em meio a dor, há uma vida que se levanta, que se ergue e segue em frente, quebrando correntes da opressão e da violência.

Essa crítica foi elaborada no ano de 2022.

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Laboratório de Crítica de Arte
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Written by Laboratório de Crítica de Arte

Críticas de Arte elaboradas por discentes de Artes Visuais da UFPB. Parte do Projeto de ensino História em (P) Artes. @historia.em.partes

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